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Aqueles que semeiam o campo, colhem o futuro
O que os mestres plantam e regam nos treinos floresce diante de nós, transformando meninos em muito mais do que atletas-mirins.
Flavia Cabral
9/8/20255 min read


Os senseis ali, no muro, olhando e cuidando de cada um deles
Quase todos os dias, o Nico entra no campo ou na gaiola para treinar. Coloca a mochila no lugar e se dirige à salinha de equipamento. Lá, dá o primeiro aceno junto com um aperto de mãos: “Ohayo, Sensei.”
Eu faço questão de acompanhar, mesmo com ele já tendo dez anos e podendo ir sozinho. Cumprimento, olhando nos olhos de cada um daqueles mestres que conduzem meu filho no mundo do beisebol. Eu nunca joguei, nem meu marido, então não sabemos como ensiná-lo a praticar o esporte. Mas confio que aqueles que estão ali, naquele espaço, têm uma vontade enorme de vê-lo se desenvolver — e vão ensinar.
Por trás de cada lance, de cada arremesso, eu vejo a mão firme e paciente de todos os treinadores que ele já teve nessa jornada que já dura três anos. Eles ensinam a técnica com cuidado, mas também ajudam a formar a criança que, muitas vezes, chega ali por ser “agitada demais”, “complicada demais”. Como se o esporte fosse só para gastar energia daqueles que são excedentes ao que se espera.
O Nico era esse menino. A escola, os familiares, os amigos diziam: “Coloca ele no esporte para acalmar essa energia.” E lá fomos nós para o mundo do beisebol. Temos a sorte de viver em uma cidade que se tornou uma verdadeira escola, com lições vindas de várias partes do mundo; brasileiros, venezuelanos, japoneses. Cada técnico traz sua bagagem, seu modo de olhar para o jogo e para a vida. Com isso, o “esporte para movimento”, a “técnica pela técnica” alcançou um patamar que não estávamos esperando.
Eles encabeçam o time, mas também ficam de pano de fundo para que as crianças brilhem
Com o japonês Nobu, Nico aprende sobre a paciência. Aquele fair play que desarma qualquer adversário. Com o Hector, venezuelano de coração generoso e espírito aguerrido, Nico descobriu a ousadia de quem não teme o erro: roubar a base, arriscar, se jogar de corpo e alma. O sensei Hiro, por sua vez, ensina que força nem sempre é tudo. “Nico, 60%”, ele diz, e o menino entende que equilíbrio vale mais do que potência. Quando a ordem é “só strike, 100%”, o pequeno obedece e executa com uma confiança que só a fé em um mestre pode construir (demorou, mas aconteceu).
Do sensei Tsuji-san, o “Ditchan”, ele absorve a técnica perfeita e a cultura, construídas em anos de beisebol no Brasil. E do sensei Zé, a coragem e a raça de quem nunca desiste de ver os meninos crescerem — e o olho seletivo por ter sido o primeiro a enxergar no Nico o potencial que ele tinha como pitcher. Nessa jornada, todos deixam sua marca: Fabrício, com seu carinho que aprimora a defesa e parece proteger o Nico dentro e fora de campo; Paulo e Wagner mostram a importância do apoio da família; Johnathan, com sua raça e rebatidas poderosas que elevam a autoestima; e Thony, com a paciência e a alegria que ensinam a importância de amar o jogo.


Orientam ao lado do campo, enquanto dão dicas para cada um deles avançar ainda mais
O trabalho de um técnico infantil é nobre e difícil: motivar quando as crianças não estão a fim, lidar com a frustração, ouvir brincadeiras e risadas na hora errada. Eu, sinceramente, não sei como aguentam ensinar vinte meninos de nove e dez anos. Mas a gente percebe o quanto os treinadores querem que nossos filhos melhorem. Eu vejo isso nos olhos deles.
E acho que percebem a parceria que nós, pais, temos com eles. Eles vêm conversar: “Eu era exatamente assim.” “Ele melhorou.” “Ele voltou a jogar o material no chão.” E lá vamos nós, com o total desconhecimento de beisebol, conversar sobre respeito ao material, ao sensei e ao tempo que cada um dedica para que ele possa ganhar o troféu de destaque que tanto adora. E Nico ouve: na inocência e na perspicácia de uma criança, junta tudo — aprendizados, elogios e “broncas” — e faz o próprio jogo.
Quando vejo o Nico jogar, não enxergo só um menino. Vejo todos os mestres em cada movimento: a paciência do Nobu, a ousadia de Hector, o equilíbrio do Hiro, a técnica do Tsuji-san, a coragem do Zé, a proteção do Fabrício, a confiança do Johnathan, a alegria do Thony… Ele joga com eles. E, de algum modo, também joga por eles.




Acompanham cada treinamento e aquecimento, como uma sombra de proteção e motivação


Celebram cada vitória e acolhem cada erro...
Enquanto ele estiver entregue ao que aprende, eu tenho orgulho de fazer algo simples: levar. Para todos os treinos e campeonatos. Trocar a tranquilidade dos dias pelo cansaço do trajeto. Honestamente, é um preço pequeno diante do que está sendo construído. Porque, no fim, não é só um esporte. É a coragem para tentar. A disciplina para aprender. A alegria de conquistar. A humildade para crescer.
Ali, entre risos, suor e poeira, floresce algo maior que o jogo: a vida, o caráter, a alma de um menino crescendo diante dos nossos olhos. E eu tenho o privilégio de assistir, sempre, cada passo desse milagre silencioso, que transformou toda a agitação do meu Nico em foco e perseverança, preparando-o para um futuro que transcende o campo.


E motivam, reconhecendo quando merecido. Um belíssimo papel.
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