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Onde cresce um time
Quando um time de crianças descobre que o talento, por si só, não é suficiente, e que o crescimento conjunto é o alicerce para ir além.
Flavia Cabral
10/22/20254 min read


Os times de Anhaguera e Atibaia, agradecendo com um belo Arigatô após o jogo
Eu já tinha ouvido tantas vezes a mesma frase: “Esse elenco é ótimo. Só não entendemos por que não deslancham.” E eu ficava assim, meio sem saber o que responder. Porque talento, de fato, sempre houve; isso é inegável. Os meninos são ótimos de verdade. Mas talento, sozinho, nunca segurou jogo ou ganhou campeonato. E foi o que sentimos na nossa participação no Circuito das Frutas 2025, campeonato que aconteceu nesse final de semana em Indaiatuba.
Senseis Nobu e Fabrício, na passagem de bastão. E Nico com o sensei Nobu, que vai voltar pro Japão
Mesmo desfalcado de dois jogadores da seleção, o time se sustentou inteiro. O coletivo segurou o peso. A defesa trabalhou afiada. Os arremessadores tomaram só dois pontos em três partidas. O ataque veio em sequência, em onda boa. Treze a zero. Dez a um. Catorze a um. Um adversário após ou outro foi caindo - Anhanguera, Cooper B, Gigantes. Acho que, dessa vez, eles chegaram à final porque estavam funcionando como unidade.
Mas final tem outro peso. Ainda mais na casa do Indaiá Cinza, um dos times mais fortes da categoria e nosso adversário. Final não testa só fundamento, mas força emocional. E ali deu para ver a estreia deles nesse território.
A pressão veio cedo e todos estavam nervosos — crianças, treinadores e nós também, pais e torcida. A cada vez que o juiz não dava o strike que eles precisavam, os meninos ficavam mais frustrados (e os pais também). O time foi engolido pelo nervosismo, e a respiração sumiu junto. A bola não encaixava, o tempo não assentava, o jogo começou a escapar no detalhe.
Até que o sensei Fabrício pediu um tempo e foi lá no montinho.. Um olhar, algumas palavras, e os meninos voltaram — não perfeitos, mas presentes. Então, entrou o pitcher mais novo, que está treinando sem descanso para merecer o montinho. Não para virar o placar; mas para segurar o chão. E segurou. Tomou pancada, sim, mas ficou firme, inteiro. Não perdeu o eixo. E a defesa conseguiu trabalhar. O jogo terminou digno e não desmoronou. E eles passaram por isso tudo ainda maiores.


Os infielders reunidos no montinho, quando o sensei Fabrício pediu tempo para motivá-los


O time do Pré-Infantil de Atibaia nos dá muito orgulho. Individualmente, os meninos estão, sem brincadeira, entre os melhores do Brasil. São rápidos, concentrados, fortes, disciplinados e, a gente sabe, que talvez sejam os que colecionam mais horas de treino. Na gaiola, durante a semana, são eles que estão lá praticamente todos os dias — nos horários destinados a eles e às outras categorias. Sempre, sem exceção, tem um menino do Pré-infantil treinando por ali. O time do meu filho, conhecido por não faltar a nenhum treino, carregava, durante os campeonatos, uma falta que ninguém conseguia nomear. Talvez fosse falta sorte, de ousadia, de acreditar um pouco mais… Não sei exatamente o que os impedia de avançar além da semifinal.
E, curiosamente, aconteceu justamente no campeonato que marcou a despedida do Sensei Nobu — o último dele no Brasil antes de voltar para o Japão — e a recepção do novo sensei principal, Fabrício, um garoto que está mais perto da idade deles do que da nossa, mas extremamente capaz e suportado por um timaço de treinadores com história. Parece que, sem ninguém combinar, eles decidiram honrar o homem que pediu deles muito mais do que braço: pediu postura, respeito, caráter e, principalmente, mais amizade. Vi menos disputa interna, mais cumplicidade. Vi meninos vibrando por todos os bons lances do outro. Vi riso leve, parceria, e uma vontade verdadeira de fazer algo juntos, não cada um por si. Como se, antes de ir embora, o sensei tivesse conseguido costurar aquilo que ele sempre quis: a sensação de pertencimento.




E foi ali que eu entendi o que faltava: eles não perdiam por falta de capacidade ou treino. Mas porque, na altura dos seus dez anos, ainda estão aprendendo a sustentar o emocional do tamanho do talento que têm. E falta a experiência de quem tinha feito várias finais, como o time adversário.
Quando acabou, eu vi tristeza por terem perdido. Depois, aceitação. E, enfim, o sorriso sincero e a explosão de felicidade de Vice-Campeão. Eles sentiram a final na pele, e isso, mais cedo ou mais tarde, vira casca. Porque é assim que um time nasce de verdade: quando passa por essas dificuldades juntos e permanecem inteiro e sem apontar o dedo para ninguém. Porque, se erram, erram como um time. E se ganham, ganham como amigos que são.
Na cerimônia de encerramento, que eles recebem os troféus coletivos e individuais, vi uma postura digna de emocionar. Eles, felizes, abriam espaço e apontavam para aquele jogador que eles entenderam, como grupo, que merecia ganhar. Em todos os anúncios: acertaram alguns, erraram outros. Lindíssimo ver essa parceria.
Eles ainda não são campeões. Mas já parecem um time que está a caminho. Porque antes de levantar a taça, todo time campeão primeiro aprende a não soltar as próprias mãos.
E seguimos. Restam só dois campeonatos neste ano — e só mais dois de Pré-Infantil para o Nico. Um deles, a etapa final do Brasileiro, em Londrina, em dezembro. A história ainda está acontecendo.
Meu grande Atibaia Pré-infantil, vice-campeão do Circuito das Frutas de 2025
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