Os Guardiões entram em ação

Porque no beisebol — e na vida — ninguém vence sem apoio

Flavia Cabral

9/15/20253 min read

Nico de arremessador, com a sua defesa parecendo guardiões.

O campo se abre em laranja contra o azul do céu. As linhas desenhadas no chão parecem uma pintura precisa. Os jogadores estão espalhados em suas posições, com um equilíbrio quase matemático, cada um parte de uma coreografia silenciosa. No centro, no círculo de terra mais clara, está ele: Nico Cabral, o arremessador.

— Olha que bonito, filho. Quando você está no montinho, parece que a defesa são seus guardiões.

Ele responde sem hesitar:

— Eles são, mãe. Existem para que nada aconteça comigo. São minha defesa. Meu time. É assim que o jogo funciona.

O beisebol é cheio de metáforas assim. O arremessador carrega o peso da partida: no centro do jogo, é o nome dele que fica registrado como quem vence ou perde. Mas ele não é nada sozinho — a defesa precisa estar lá para garantir que nenhuma bola caia e nenhum corredor avance. Para mim, o melhor jogo não nasce apenas de strikeouts, mas também das rebatidas potentes, que dão ritmo e provocam aquele frio na barriga. É nesse instante que a defesa entra em cena para transformar o arremesso em out.

Há algo ainda mais fascinante: o arremessador está de costas para quem o protege. Quem enxerga tudo é apenas o receptor — essa figura discreta, espremida entre o árbitro e o rebatedor, que pede a bola com sinais que só a dupla entende. Há uma confiança silenciosa nesse gesto: lançar sem ver, acreditar no chamado, depender do outro. Pequeno quando agachado, mas gigante quando se levanta.

O jogo segue assim, cheio de símbolos. O rebatedor, quando consegue avançar, precisa retornar ao lar — o home — e levar consigo os colegas que ficaram nas bases. É preciso chegar salvo, e se houver companheiros no caminho, resgatá-los também. É um jogo sobre confiar, proteger e compartilhar o caminho de volta.

Nico defendedo a casa como terceira base, ajudando o seu time (e seu pitcher) a não tomar um ponto

Talvez seja por isso que o jogo seja tão bonito, tão plástico, tão fotografável. Cada arremesso suspenso no ar, cada luva esticada na hora certa, cada corrida para reencontrar o lar são quadros perfeitos que ficam guardados na memória, como páginas de um álbum de família.

Mas fora do campo, o beisebol mostra realmente que transpassa.

Esse fim de semana, teve um campeonato em Marília — umas seis horas de viagem até lá de Atibaia. Durante esses campeonatos longos, os meninos ficam juntos o final de semana inteiro e fazem tudo em conjunto: banhos, refeições, sono. Risadas, brincadeiras, correria, apoio e muito jogo. Só de andar pela rua em grupo, para tomar um sorvete, dá para notar como parecem sincronizados, um time.

Dentro e fora do campo: uma vivêcia inesquecível para uma criança

Na manhã de domingo, eles iriam jogar o segundo jogo, só umas 10h. Mas já era 5h3o quando as primeiras crianças começaram a acordar as outras. Eu estava indo mais cedo para o campo e perguntei:

— Filho, estamos saindo. Preciso anotar o primeiro jogo. Você quer ir de carro com a gente?
— Não, mãe. Vou ficar aqui e tomar café com eles, minha segunda família. Meu time de beisebol.

No campo, ninguém joga sozinho. Na vida, também não. Sempre existe alguém atrás de você, pronto para segurar a bola que escapou, pronto para te proteger. É assim que se aprende a confiar, a dividir o peso, a carregar uns aos outros.

E quando vejo meu filho dizer que encontrou no beisebol a sua segunda família, eu entendo: não é só um jogo. É identidade, é pertencimento, é o lugar onde ele sabe que nunca está só. É amor em forma de time. É casa em qualquer lugar. É beisebol.

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